Ame acima de qualquer circunstância!

Queridos,

Gostaria de compartilhar algo especial a respeito do meu pai. Eu não sei se a sua história é parecida com a minha, ou se diferente mas também se tratando da ausência do seu pai, mas eu quero te incentivar a AMAR acima de qualquer circunstância, se ainda houver tempo, ou seja, se ele ainda estiver vivo!

Não recebi afeto, nem mesmo sustento, pois era minha mãe que atendia todas as necessidades da casa. 

Por 30 anos moramos na mesma casa, e vi coisas terríveis que ele fazia em consequência dos vícios. Enquanto sóbrio era inteligente, organizado, às vezes sério, às vezes bem-humorado, mas sempre reservado. Diante das bebidas, o que era constante, se tornava irreconhecível nas palavras e atitudes. Como isso era frequente e corríamos risco de vida frequentemente, eu, minha mãe e meu irmão nos mudamos para outro bairro, local onde ele nunca soube pois certamente iria atrás.

Lembro-me que em 2008 ele aceitou a Jesus. A vida dele estava toda errada em todas as áreas, e quando ele começou a colocar Deus no controle de sua vida, o deserto começou a florescer. Até um emprego conseguiu, depois de 20 anos sem trabalhar. Conseguiu reduzir a quantidade de bebida, e estava bem transformado. 

Meu pai sempre gostou muito de ler, e teve até uma época que ele ganhou um pequeno e simples livro chamado “Benção e maldição” (Pr Jorge Linhares), e ele leu de frente pra trás, de trás pra rente. rsrs Percebeu quanto dano e maldição lançou sob a vida dele mesmo e na família. Então um dia ele chamou a mim e meu irmão, nos pediu perdão (lembro como se fosse hoje), e eu recordo que foi um momento muito forte. Senti como se pesadas algemas espirituais estivessem me libertando de uma dor que eu não conseguia mais suportar. As coisas começaram a melhorar... Mas depois de 3 anos ele confiou em sua própria força, parou de ir à igreja, voltou a beber tanto quanto antes, perdeu o emprego, a família cada dia mais se afastava porque corria riscos, etc.

Minha relação com ele sempre foi muito difícil, porque não foi construída uma relação afetiva de pai para com filha no decorrer dos anos. Ouvi muitos absurdos, muitas palavras de maldição sob a minha vida, e se não fosse o Senhor a me curar, eu ainda seria hoje uma pessoa depressiva como eu era até minha adolescência, quando aceitei a Jesus como Senhor da minha vida. Mas eu tentava na medida do possível. Me esforçava para colocar a Palavra de Deus como verdade ali naquela situação dia a dia.

Como ele passou a morar sozinho depois que nos mudamos , todas as vezes que eu ia visitá-lo demonstrava meu amor com tarefas... não tinha muito assunto, mas eu fazia faxina na casa dele, pois de organizado e cuidadoso passou a se descuidar, ficando desgostoso. Fazia comida, almoçávamos e deixava uma qtde pronta pra que ele pudesse se sentir cuidado pela filha. Era muito sofrimento pra mim estar lá então eu não ia todos os finais de semana mas quando eu não ia eu ligava. 

Enquanto pude estar com meu pai fiz tudo o que eu pude. Tentei médicos, tratamento contra a dependência química, etc, mas ele não queria , não aceitava. Com o tempo ele começou a ficar mais sensível na saúde, e sem conseguirmos levar ao médico nem mesmo à força, as coisas foram piorando.

Me lembro inclusive de um curso que fiz na igreja, uns 4 meses antes dele falecer. Foi um tratar de Deus nessa relação num momento preparado por Ele, como um presente. O curso era específico para mulheres sendo que eram 9 alunas casadas e só eu de solteira na ocasião. No entanto, o cuidado de Deus era tanto, que as tarefas eram dadas para as casadas exercerem as atividades com seus esposos, e as minhas eram adaptadas para eu tratar com meu pai. Foi algo incrível, de Deus mesmo para conseguir liberar a expressão de amor num desatar de cura e libertação ! 

Em 2015 infelizmente meu pai foi à óbito pelas consequências geradas por mais de 50 anos de bebida alcoólica e uso de cigarro. Há muitos anos vinha sofrendo mas não permitia que eu nem meu irmão o levássemos ao médico. Tentamos de várias formas, mas não conseguimos. Até que um dia chegamos lá e ele estava quase desmaiado. Ainda conseguia falar, mesmo que com dificuldades. 

Meu irmão deu um banho nele, pois ele não conseguia ficar de pé sozinho, e então meu irmão disse a ele que se não aceitasse ir ao Hospital conosco, chamaríamos o SAMU. Ele não aceitou. Também não tinham como pegarmos pelo braço e levar à força. Até que liguei pro SAMU e tive a informação que sem a permissão dele os Bombeiros não poderiam levá-lo. Argumentei o fato dele ser idoso e que aquela era a única forma de levar meu pai e ser socorrido. A médica então perguntou se ele conseguia falar e eu disse que sim. Com dificuldades passei o telefone pra ele e a médica conseguiu convencê-lo com muito custo,  ele então autorizou a ida do socorro. Falei pra ela aproveitar e autorizar o envio do carro antes que ele mudasse de ideia. E os bombeiros chegaram. Foi um dia muito difícil... nunca me esquecerei.

Dia 11 outubro de 2015, domingo pela manhã, os bombeiros desceram meu pai com um cobertor pela escada, pois não não conseguia mais andar, e lá embaixo o colocaram na maca. Fui junto com ele na ambulância, e lá chegando foi direto pra sala vermelha do Hospital Rocha Faria. Como todo hospital público no Brasil, péssimas condições, dificuldade de vaga, falta de higiene, macas sujas, pacientes deitados sem lençol, falta de espaço para circular, etc. 

Em 2 dias meu pai intercalou a sala vermelha e verde várias vezes, por falta de vaga. Pela gravidade ele não deveria ter saído da vermelha, aliás, deveria ter ficado no CTI. 

Enquanto esteve internado, eu e meu irmão o acompanhamos quando era possível. Lembro-me de ajudar o dia todo com as cobertas, auxiliando na máscara de oxigênio, dando as refeições na boca com uma colherzinha, pois nem no canudinho ele conseguia mais sugar. Ele ficava me olhando, e parecia que estava percebendo que uma das pessoas que ele mais maltratou era quem estava ali com ele até o final. Relato isso em lágrimas.... 

Depois, já ficando muito debilitado, algumas vezes quando conseguia dizer algo falava comigo alguns assuntos muito confusos, já efeitos da confusão mental causada pela insuficiência renal. Hoje entendo que a função dos rins é filtrar e impedir que as impurezas cheguem ao sangue e quando isso acontece a pessoa fica confusa em seus pensamentos e relatos. Quando ele dizia algo estranho, me doía muito, mas eu tentava me mostrar forte e com carinho entrava na conversa dele, mesmo nos assuntos mais loucos que surgiam. Só pra não gerar ainda mais desconforto a ele.

Na segunda à tarde ele ficou muito inquieto e estava com muita falta de ar, mesmo com a máscara de oxigênio 24h. O pulmão já estava muito debilitado. Eu chorei muito e corri para chamar o médico que estava no setor. Ele disse que não podia fazer nada e que eu deveria chamar a enfermeira. A chamei e ela me respondeu que também que não poderia fazer nada. Fiquei chorando sem saber o que fazer ao ver meu pai naquela situação e eu sem poder fazer nada. Era feriado, e os outros médicos sumiram. Corria de um lado pro outro e um mandava falar com outras pessoas, mas não aparecia um médico... foi difícil. Desisti e continuei com meu pai.. depois de um tempo a inquietação melhorou um pouco... dei as refeições líquidas na boca, cuidei, fiquei ali clamando pela misericórdia de Deus. 

Eu não sabia se ele sobreviveria, mas independente disso eu queria que o Senhor me desse a certeza da salvação dele. Seria meu maior presente. 

Depois de umas horas, passaram umas irmãs orando por todos os doentes. Elas iam perguntando um a um quem queria oração e então oravam! Mas ao chegarem na vez do meu pai, elas não perguntaram e eu só chorava. Uma irmã orou por ele e no final me disse: “Filha, tenha paciência com seu pai”. Ali eu entendi que eu deveria cuidar dele da melhor forma possível, independente do que viria. Assim fiz. Alguns minutos depois, o Espírito Santo falou muito forte ao meu coração: “Auxilia seu pai para que ele reafirme o voto feito com Jesus”. Eu resisti um pouco achando que era coisa da minha cabeça, mas era muito forte. Então falei no ouvido dele: “Pai, reafirma seu voto com Jesus”. Ele respondeu que sim, e que ele já tinha aceito. Isso foi de dia.

Às 20h falei pra ele que ia embora e que meu irmão iria me render pra ficar lá a noite toda com ele. Eu disse que eu voltaria na manhã seguinte... (estou em lágrimas...). Mas esse novo encontro não aconteceu. Até a hora que eu permaneci ali ele tinha tido uma certa melhora. Quando meu irmão chegou e viu e se alegrou também. Pela madrugada ele teve outra forte crise, meu irmão conseguiu uma nova transferência para a sala vermelha (de onde nem deveriam ter tirado), e ali ele ficou, até falecer na terça, 13 de outubro às 19h com pneumonia, enfisema pulmonar, insuficiência renal e choque séptico, que pelo que pesquisei seria manifestação de bactérias provavelmente do próprio hospital, que o debilitaram ainda mais, levando-o ao óbito.

Sabe, enquanto ele estava vivo, ele era irredutível e estava sem controle nos vícios. Corria muitos riscos e eu ficava com meu coração na mão com medo de acontecer alguma coisa com ele na rua, bêbado, e nunca sabermos o que aconteceu. Muitas vezes eu fiz bilhetinhos com meus telefones de contato e do meu irmão e pedia pra ele não ir a lugar nenhum sem o papelzinho na mochila ou na carteira. E ele sempre andava.

Meu pai partiu, chorei muito e às vezes ainda me dói saber que aqui na Terra não o verei mais, mas ao mesmo tempo sinto paz, porque Deus me deu a oportunidade de ajudar meu pai a reafirmar o voto com o Senhor. Eu creio que nos veremos na Glória !

Eu tive muitos motivos para ter ódio do meu pai e não procurá-lo mais, porém o Espírito Santo me ensinou que o PERDÃO gera paz não só pra quem perdoa, como para quem aceita o perdão. Se eu não tivesse perdoado meu pai, nem dado assistência enquanto estava vivo, mesmo com as dificuldades não aprendidas de afeto, certamente diante de seu falecimento eu estaria me culpando por não ter feito o que deveria dando suporte e amor. 

Amor não é apenas sentimento, mas atitude. Ame acima de qualquer circunstância!

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Esse é meu relato sincero e pessoal redigido com muitas lágrimas em 21 de outubro de 2015: 1 semana após o falecimento do meu pai RENATO MENI (in memorian). 
Texto revisado em 14/08/2020.


Autoria:
 Juliana Meni


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